Antes de tratar sobre energia, é importante conceituar a economia circular. Por definição, a economia circular deve manter os produtos e materiais em uso e projetá-los para serem reciclados ou reaproveitados, eliminando desperdícios.
Economia significa administrar recursos escassos, e circular indica um sistema fechado – e de certa forma cíclico. “Assim, quando mencionamos a economia circular, significa desenvolvermos, como sociedade, a capacidade de administrar o uso de recursos, renováveis e não renováveis, de maneira a não causar alterações no meio ambiente em que vivemos, ou seja, sem causar impactos.” destaca a especialista Leidiane Mariani.
Segundo o Parlamento Europeu, Economia Circular é um modelo de produção e consumo que implica em compartilhar, alugar, reutilizar, consertar, renovar e reciclar materiais e produtos existentes todas as vezes que seja possível para criar um valor agregado. Dessa forma, o ciclo de vida dos produtos é ampliado.
Economia circular e o setor de energia.
“Tendo o conceito de economia circular em mente, ao aplicarmos no setor energético, podemos defini-lo como a capacidade de fornecermos energia para os processos da sociedade e promoção de melhores condições de vida, de maneira que o uso de recursos e a geração de resíduos consiga ser absorvida pelos ciclos naturais de regeneração e decomposição do planeta, sem causar impactos negativos nos ecossistemas existentes.” conceitua Leidiane.
A aplicação da economia circular no setor energético vai desde o uso de fontes renováveis, passando pela descentralização da geração, até a produção e o uso mais eficiente da energia. Lembrando que quando falamos em energia, estamos falando de energia em suas diversas formas, como elétrica, térmica, combustíveis, etc.
Fontes de energia como a eólica, a solar e a biomassa se destacam na matriz energética brasileira nesse sentido. Dentre as de biomassa, damos destaque para o biogás e os biocombustíveis.
A cadeia de biogás como vetor da economia circular.
As fontes que usam resíduos que poderiam gerar gases de efeito estufa em sua degradação nos processos tradicionais, se destacam no conceito de economia circular. Nesse caso, são exemplos o biogás a partir de resíduos, que vem se desenvolvendo bastante nos últimos anos e tem um grande potencial no país, e o biodiesel produzido a partir de óleo de cozinha e resíduos gordurosos.
O biogás no Brasil comumente é obtido a partir da digestão anaeróbia de resíduos orgânicos provenientes da agropecuária, do saneamento e de indústrias, como usinas sucroenergéticas. Desde o início do processo, a cadeia do biogás contribui para redução de impactos negativos de outros processos, ao converter resíduos em insumos, reduzir emissões de carbono, e possibilitar a produção de fertilizantes, energia elétrica, térmica, combustível veicular, gás carbônico e até hidrogênio.
Para Leidiane Mariani, nossa especialista convidada com vasta experiência no setor de biogás, a cadeia de valor do biogás talvez seja a que mais se aproxima do conceito de economia circular dentre as fontes de energia existentes.
Sendo considerado um mercado em ascensão no Brasil, segundo a Abiogás, o biogás tem potencial para suprir cerca de 30% da demanda de energia elétrica do Brasil, ou substituir até 70% de todo o consumo de óleo diesel. Em 2021, segundo o Biogasmap, iniciativa elaborada sob a liderança do CIBiogás, foram mapeadas 811 plantas existentes, no entanto, o país desfruta de apenas 2% de todo o potencial de produção de biogás.
Economia circular em prol da descarbonização de economias globais.
Temos acompanhado as discussões em torno das mudanças climáticas e percebemos que há um consenso sobre a necessidade de acelerar a mitigação global de emissões de carbono para evitar consequências climáticas desastrosas. Caso contrário ondas de calor, enchentes, furacões, secas, inundações se repetirão com mais constância e prejuízos às economias dos países se multiplicarão.
Dentre os conceitos e exemplos apresentados, é possível afirmar que a economia circular na prática preconiza a redução e otimização do uso de recursos, o que reduz a demanda por combustíveis e materiais fósseis, reduzindo as emissões de carbono.
“Ou seja, a economia circular é imprescindível para o cumprimento das metas de descarbonização que os países vêm assumindo. O setor energético, por ser um dos grandes emissores de gases de efeito estufa, tem papel importante na aplicação da economia circular para a descarbonização.” reforça Leidiane.
Os principais caminhos para o desenvolvimento do setor de energia no sentido da economia circular envolvem a redução da dependência de combustíveis fósseis, a mudança de modelos de negócio e o desenvolvimento de tecnologias. Além disso, a mudança de hábitos da sociedade, o diálogo intersetorial para mudança conjunta de fontes energéticas; e a regulação priorizando práticas sustentáveis também são fundamentais para se alcançar resultados positivos.
A inovação é chave para o desenvolvimento de produtos e processos mais sustentáveis e integrados à economia circular. Para isso, será necessário também acelerar investimentos na esfera pública e privada com foco em desenvolver soluções integradas e adaptadas às realidades locais, abordando não apenas a mitigação de emissões, mas também a adaptação às mudanças climáticas.
Sobre Leidiane Mariani:
Especialista em biogás e biometano, aproveitamento energético de resíduos, transição energética, descarbonização e sustentabilidade. Tem experiência de quinze anos e atua como consultora em estudos e planejamento do mercado brasileiro de biogás em projetos de cooperação nacional e internacional. É engenheira ambiental, especialista em energias renováveis, mestre em gestão territorial e doutora em planejamento de sistemas energéticos. É membro do Instituto 17, ONG que trabalha com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, e é cofundadora e coordenadora de parcerias da rede Mulheres do Biogás.
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*A autora agradece pelas contribuições ao artigo de Lais Alves Souza e Maria Eduarda Rosa.