Bruno Nunes
Coordenador-Geral de Bioeconomia
CGBE/DEPPD/SEFAE/MCTIC
bruno.nunes@mctic.gov.br
BIOECONOMIA – Caminhos e Ciência para um Biofuturo
Já se fazem sentir os efeitos das mudanças demográficas e do clima. Estas são crises debatidas há décadas em fóruns globais. No entanto, recentemente nos vimos frente a outras duas crises, de origens sanitária e econômica. Estas vêm se somar aos desafios já postos pelas duas anteriores. É certo que a pandemia causada pelo novo coronavírus só será resolvida com a ajuda da ciência. No entanto, e as demais crises demográfica, climática e econômica, quais serão os caminhos para seu enfrentamento e resolução?
São múltiplas as respostas a essa pergunta. Entretanto, tal como ocorre com a COVID-19, Ciência, Tecnologia e Inovação são palavras-chaves nas soluções a tais desafios. Muitas estratégias para o enfrentamento destas crises estão sendo elaboradas em todo o mundo e ponto comum entre elas é o papel basal e estruturante que o desenvolvimento científico e tecnológico possui. Outro ponto comum é a necessidade de desenvolvermos novos modelos econômicos que sejam circulares e baseados em recursos renováveis, com destaque às biomassas. Estes modelos se contrapõem aos modelos atuais, lineares e baseados em recursos finitos, com destaque às matérias-primas fósseis e minerais.
Essa mudança de modelo econômico se faz necessária quando analisamos as projeções da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO/ONU). Segundo ela, o mundo abrigará, em 2050, cerca de 9,7 bilhões de habitantes. Esse crescimento populacional, aliado aos contínuos processos de urbanização, envelhecimento e aumento estimado na renda média per capita, significará uma pressão ainda maior sobre os recursos naturais e meio ambiente. Estimam-se, por exemplo, aumentos nas demandas por energia, água e alimentos na ordem dos 35%, 55% e 70%, respectivamente, tendo como base valores de 2005. Além disso, o mundo enfrentará nos próximos anos uma forte crise econômica decorrente da crise sanitária atual. Há uma preocupação efetiva de que a retomada das atividades econômicas se dê sobre bases sustentáveis, contrapondo-se ao atual modelo de desenvolvimento econômico. A diminuição das atividades econômicas está nos possibilitando repensarmos como iremos retomá-las.
Exatamente por isso, toda estratégia que proponha solucionar os problemas associados aos novos cenários demográficos e econômicos deverá levar em consideração questões de mitigação e adaptação aos efeitos da mudança do clima. Além disso, deverão ser menos impactantes ao meio ambiente e buscar ofertar soluções aos problemas de poluição já enfrentados, considerando a necessidade de preservação e recuperação ecossistêmica bem como de circularidade econômica. A depleção dos recursos naturais e as contaminações ambientais também deverão ser priorizadas nas novas estratégias produtivas. Nesse cenário, a bioeconomia surge como um novo paradigma econômico para auxiliar na solução de parte das crises globais, presentes e futuras.
O conceito de bioeconomia tem sido foco de debates nos últimos anos, estando em plena evolução e difundindo-se de forma expressiva em diversos países, especialmente aqueles com economias mais desenvolvidas. De modo geral, vários países, ao elaborarem suas estratégias de bioeconomia, focam na exploração dos recursos biológicos renováveis (biomassas) e no desenvolvimento e uso de conhecimentos científicos e tecnológicos, a exemplo da biotecnologia, como eixos da promoção do desenvolvimento sustentável.
Com isso em mente, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI) elaborou o Plano de Ação em Ciência, Tecnologia e Inovação em Bioeconomia (PACTI Bioeconomia), documento orientador para o desenvolvimento científico, tecnológico e de inovação em bioeconomia com vigência até 2022. Nele são apontadas as Linhas Temáticas que necessitarão ser fortalecidas ou implementadas para a superação dos desafios e o aproveitamento das oportunidades apresentadas pelo setor. Além disso, foram definidas as diretrizes gerais que deverão nortear o desenvolvimento bioeconômico nacional nesse período.
Cabe destacar que a publicação deste documento também possui caráter seminal, pois pretende iniciar os debates, em nível governamental, sobre a necessidade de se estruturar uma instância de governança em âmbito federal para o desenvolvimento da bioeconomia. Uma vez que o Brasil já desempenha diversas ações em bioeconomia que, no entanto, são executadas de forma desarticulada, tal instância torna-se vital para o constante debate e definições quanto ao desenvolvimento da bioeconomia nacional e para a convergência e sinergia de ações. Outro aspecto importante desse documento é a proposição de instituição de um centro virtual de inteligência sobre a bioeconomia brasileira, que poderá captar, analisar, sintetizar e disponibilizar informações qualificadas sobre a bioeconomia brasileira para tomadores de decisão e público geral.
Outro aspecto importante nesse documento foi a definição que o MCTI usa em suas políticas públicas para o desenvolvimento da bioeconomia. Cabe ressaltar que tal definição, como as de outros países e instituições internacionais, é passível de modificações, sendo que o projeto Oportunidades e Desafios da Bioeconomia – ODBio, vem analisando a construção de um novo campo conceitual sobre a bioeconomia brasileira. No entanto, para efeitos práticos, a atual definição que o MCTI dá para a bioeconomia é:
“O conjunto de atividades econômicas baseadas na utilização sustentável e inovadora de recursos biológicos renováveis (biomassa), em substituição às matérias-primas fósseis, para a produção de alimentos, rações, materiais, produtos químicos, combustíveis e energia produzidos por meio de processos biológicos, químicos, termoquímicos ou físicos, promovendo a saúde, o desenvolvimento sustentável, o crescimento nacional e o bem-estar da população.”
O PACTI Bioeconomia está disponível no link http://www.mctic.gov.br/mctic/export/sites/institucional/ciencia/SEPED/Arquivos/PlanosDeAcao/PACTI_BIOECONOMIA_web.pdf
Para maior compreensão do papel estratégico da bioeconomia no desenvolvimento sustentável do Brasil, aconselha-se também a leitura da Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (ENCTI 2016-2022), disponível no link https://www.mctic.gov.br/mctic/export/sites/institucional/arquivos/ASCOM_PUBLICACOES/encti_2016-2022.pdf
Brasília, 25 de junho de 2020.[1] Este artigo é o primeiro de uma série de artigos que abordará o tema da bioeconomia e como esta vem sendo desenvolvida no Brasil. Serão abordadas as ações em execução e em desenvolvimento por algumas entidades bem como quais as oportunidades e desafios a bioeconomia brasileira apresenta.
Sobre o autor:
Bruno César Prosdocimi Nunes é Zootecnista formado pela FZEA/USP, com mestrado em Qualidade e Produtividade Animal pela mesma instituição. Atualmente é tecnólogo do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), atuando como Coordenador Geral de Bioeconomia (CGBE / MCTIC). Anteriormente, atuou como consultor técnico na equipe de ministros do MCTIC. Ele é membro suplente do MCTIC no Conselho Nacional de Gerenciamento do Patrimônio Genético (CGen) e membro suplente no Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH).