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Strategic Foresigh e o Futuro da Energia Renovável

A velocidade das transformações no século XXI está aumentando principalmente guiadas pelo conhecimento e desenvolvimento tecnológico, de um modo que a única certeza quando pensamos no futuro é que ocorrerão mudanças intensas nos mercados, na cultura, na tecnologia, na economia, no meio ambiente e na política.

Já no pós-guerra, Estados e grandes empresas se preocupavam em antecipar tendências para estarem preparadas para as mudanças, assim, nos anos 1950 surge nos Estados Unidos, o Strategic Foresight. Naquele período, o objetivo era se antecipar para grandes tendências de longo prazo, com horizonte de pelo menos 30 a 50 anos. Era outra sociedade, as mudanças, embora importantes e de grande impacto, tomavam tempo e ocorriam ao longo de décadas. Era o tempo da guerra fria, dos programas nucleares, da expansão rápida da exploração de petróleo e apenas o início da era da informação e computadores, mas grandes empresas já começavam a trabalhar com a prospectiva da queda do Muro de Berlin, um mundo de marcados integrados e de maior fluidez global. Um bom exemplo é a Shell, que superou as crises do petróleo nos anos 70 ao se antecipar à dependência do petróleo árabe e iniciar a exploração de óleo e gás no mar do norte, considerado neste período como uma região inexplorável e cara demais.

A partir dos anos 1990 até o início dos anos 2000 a transformações passam a acelerar em um contexto geopolítico de globalização, o uso mais intenso de computadores pessoais e a revolução tecnológica que vivemos começa a se tornar mais presente. Se populariza a telefonia móvel e a internet, mas a maior parcela das empresas não compreende bem como essas novas tecnologias pode alterar seus negócios, bem como as pessoas não percebem as mudanças de hábitos que se iniciam. A velocidade das transformações, embora já aumentada, ainda não é percebida como grande ameaça, mas é desse período nossas últimas lembranças das já jurássicas linhas fixas, telefones públicos, talões de cheque, cartas, fotografias, mapas, catálogos e enciclopédias impressas. Grandes empresas globais entram em crise por não se preparem para as mudanças, como por exemplo a Kodak, Xerox e BlockBuster.

Gradualmente, a velocidade vai aumentado e o mundo passa a ser “real time”. Chegamos, após 2010, na era da conectividade e logo após a crise de 2008 há uma florescência de novos modelos de negócio. Um bom exemplo do uso do Strategic Foresight para o planejamento dos negócios é o caso do Uber. Em 2009 Garret Camp, após pagar 800 Dólares por um carro com motorista particular na véspera de ano novo, começou a pensar em uma forma de reduzir o custo deste tipo de serviço. Era também o início da popularização dos smartphones e da internet móvel de alta velocidade. Garrent então antecipou as mudanças que essas duas tecnologias trariam, mobilidade da internet e alto poder de processamento móvel, juntamente como uma ideia ainda contestada no período, a do compartilhamento e não a compra de bens de serviços, fundando uma empresa de transportes, mas que não possuía um único carro. O resto da história, já conhecemos e vemos todos os dias nas ruas.

E por fim, chegamos aos dias atuais, que muitos chamam de era das transformações exponenciais. Neste contexto, o Strategic Foresight também sofre transformações. Diferentemente dos anos 50,60 e 70, não é mais viável buscar antecipar as transformações de 30 anos, mas no horizonte de 5 a 10 anos, mas é absolutamente necessário para antecipar as mudanças e se preparar para o que poderá acontecer. Este é o objetivo do Strategic Foresight, antecipar o que pode acontecer e adotar estratégias que levem ao futuro desejado. O Strategic Foresigh não espera prever o futuro ou dar respostas exatas às questões, mas tendências e aproximações que antecipem um cenário futuro. O professor de Foresight da Universidade do Colorado, Evan Vlachos, bem coloca que empresas que usam o Strategic Foresight preferem estar aproximadamente certas a estarem precisamente erradas.

Assim, o Strategic Foresight tem importância e aplicação em todos os contextos organizacionais, inclusive para o setor energético. Nos próximos anos muitas tecnologias como Inteligência Artificial e 5G impactarão todos os negócios e com energia não será diferente. Modelos preditivos de machine learning integrados a grande velocidade de transmissão de dados e processamento na nuvem alterarão as formas operação de sistemas elétricos desde a geração até o consumo. Será a fase da ampla implantação e disseminação dos smart grids e integração total das redes com maior descentralização da geração, principalmente com uso de sistemas fotovoltaicos.

A energia solar aparece como principal protagonista das mudanças nos sistemas energéticos nos próximos 5 a 10 anos, já que os custos dos sistemas continuam a cair e o desenvolvimento tecnológico melhora a eficiência. O mesmo pode ser dito sobre sistemas de armazenamento, especialmente sobre baterias de lítio, que tem dobrado de capacidade com quedas nos custos na esteira da revolução da eletrificação da mobilidade com custos atuais na casa da 200 dólares por kWh.  A startup Francesa Transition One aposta na conversão de carros a combustão interna em veículos elétricos ao custo de 5 Mil dólares, incluindo um motor elétrico, baterias e o sistema de operação do carro. Semelhante à conversão de veículos para GNV ocorrida no Brasil, esta tendência pode representar um imenso mercado e eletrificação da mobilidade independente das grandes montadoras.

Ainda em relação ao armazenamento, empresas em todo o planeta desenvolvem pesquisas como o armazenamento em domos da sal, hidroelétricas reversíveis e até uma torre de blocos de concreto para armazenar energia potencial com o posterior ciclo reverso de e aproveitamento da energia e eficiência de 90% desenvolvido por uma Start Up chamada Energy Vault. A companhia afirma ser capaz de fornecer armazenamento a 150 dólares por kWh e que, ao contrário das baterias de lítio, não perde sua capacidade ao longo do tempo. Algumas ideias ainda perecem ficção científica, mas o caminho do armazenamento de energia é uma tendência certa e necessária para a substituição dos combustíveis fósseis por energia renováveis nas próximas décadas.

Outra fonte que continua com desenvolvimento e queda de preço é a energia eólica, especialmente com a implantação de plantas offshore, com preço abaixo de 50 dólares por MWh já em 2023, uma significativa redução dos atuais 75 dólares por MWh. A energia hidroelétrica, continuará em alta no Brasil, especialmente com o aumento no número de PCHs e CGHs. Estas pequenas usinas correspondem hoje a 3% da matriz energética brasileira e a EPE prevê um aumento de 2400 MW, praticamente dobrando a participação desta fonte na próxima década. No caso da energia hidroelétrica praticamente já se alcançou o limite físico da eficiência da geração com a tecnologia atual, com apenas pequenas melhorias incrementais atingindo a casa de 93%, contudo há imenso mercado e oportunidades para a melhoria da gestão operacional, recuperação e retrofit de usinas e melhoria do uso e despacho da energia com o uso da tecnologia e na conexão de redes inteligentes.

Na energia, assim como em todos os mercados, a única previsão correta sobre o futuro é a mudança constante, no entanto, existem formas de antecipar os futuros possíveis e traçar a trajetória e estratégia para construir um futuro desejável. O Strategic Foresight mais do que nunca é uma ferramenta poderosa para a definição de estratégia e tomada de decisão para empresas e organizações de todos os tamanhos.

 

Enviado por: Pedro Masiero


Pedro Masiero é graduado em Engenharia Sanitária e Ambiental pela UFSC, especialista em engenharia de petróleo pelo IBP, especialista em gestão e planejamento de negócios pela FAE Business School. Fundador da Lummi Energia e Ceos, atua no gerenciamento e viabilidade de projetos de energia e na disseminação do Strategic Foresight como ferramenta para planejamento de negócios e da inovação.